Por que os games podem constituir ferramentas para aprendizagem formal
O Que jogo é esse? está apresentando uma série de posts sobre os maiores mitos a respeito de jogos digitais e crianças ou adolescentes, sendo que nas semanas anteriores foram abordados o mito do tempo de jogo, o mito da classificação indicativa e o mito da falta de benefícios dos games. Nesta semana, trato do quarto: o mito da aprendizagem.
Jogar e aprender são atividades distintas, portanto jogos digitais não constituem ferramentas de aprendizagem formal (conteúdos escolares), servem apenas para diversão.
Será que não é possível conjugar aprendizagem formal e games? Se fosse, o que aconteceria?
Historicamente, pode-se dizer que o jogo, conforme coloca Huizinga no livro Homo Ludens, faz parte da cultura. Atualmente, isso é reforçado pelo fenômeno das crianças, muitas vezes, começarem a interagir com games antes mesmo de andarem ou falarem, constituindo o primeiro contato tecnológico destas.
Inclusive, o primeiro game voltado à aprendizagem formal foi o Where in the World is Carmen Sandiego? Este game, produzido pela Brøderbund Software na década de 80, era voltado à área de Geografia, sendo que o enredo tratava de um detetive da ACME que busca ao redor do mundo pistas para capturar Carmen Sandiego, ex-detetive que fundou uma agência de vilões. Só que se fosse utilizada a versão em inglês, também era possível trabalhar conteúdos da língua inglesa, abordando aspectos de construção de sentenças, vocabulário, dentre outros. Este game de sucesso posteriormente gerou uma série de animação, que atualmente está sendo novamente produzida pela Netflix.
Só que com a ampla variedade de games que existem no mercado atualmente surge uma outra questão:
É possível usar jogos digitais que não foram feitos com fins educacionais no processo de aprendizagem formal?
Os games voltados ao entretenimento podem constituir plataformas para aprender sobre determinados conteúdos, como é o caso do Minecraft, que permite não só trabalhar aspectos voltados à matemática (ex: geometria, volume, área), como à arquitetura (ex: planejamento urbano), à história (ex: reprodução de monumentos ou períodos históricos), dentre outros.
O sucesso, uso e potencialidades do Minecraft no âmbito educacional levaram a Microsoft a criar o Minecraft Education Edition, versão elaborada especificamente para o contexto de sala de aula. Esta possui um tutorial para aqueles que nunca interagiram com o jogo e permite ao professor, dentre vários elementos, controlar o mapa (demarcando o limite do território e em que lugares construir) e desenvolver um ambiente virtual conforme o tema que ser
á objeto de estudo em sala de aula. Já o estudante pode documentar suas atividades por meio de uma câmera, sendo que as fotos podem ser acrescidas de anotações, dispostas em portfólios. Destaca-se ainda que o Minecraft não só é divertido como também estimula a criatividade. Outra vantagem é que muitas crianças já jogam com Minecraft em casa, portanto já possuem familiaridade com as ferramentas presentes no universo dos blocos de construção, propiciando uma interação em que o foco também é uma habilidade em destaque.
Jean Paul Gee, estudioso da área de games e educação, coloca que jogos digitais de cunho comercial constituem “máquinas de aprendizado”, pois os jogadores precisam apreender a mecânica de funcionamento, o que indiretamente leva à aprendizagem de vários assuntos. Assim, o game constitui um ambiente de aprendizagem personalizado, que oferece feedback, propicia pensar a respeito do problema ou desafio apresentado, constituindo ainda um dispositivo para um processo metacognitivo.
Flexibilidades de uso de games em ambientes escolares
A flexibilidade e a adaptabilidade dos games podem ser aproveitadas em diferentes contextos e propostas educacionais, resultando em estratégias didáticas diferenciadas do jogar em sala em aula. Em primeiro lugar, destaca-se que é possível utilizar um game como elemento para documentação, ou seja, o estudante pode escrever sobre o processo realizado num determinado universo, reconhecer padrões e tomar as decisões pertinentes (conforme o contexto). Outra possibilidade diz respeito ao game como elemento inicial para discussão, ou seja, um jogo digital pode fomentar a discussão de uma determinada disciplina, a exemplo do jogo de estratégia Civilization, que trata desde da origem dos seres humanos como nômades até a constituição de uma civilização. As possibilidades são inúmeras, sendo que uma delas é construir os próprios jogos digitais.
E aí professor, gostaria de criar games para suas aulas? Claro que uma das etapas fundamentais é jogar, bem como também aprender sobre game design. Mas, eu gostaria de fazer uma sugestão e deixar um desafio diferente: já pensou em disponibilizar uma ferramenta para seus estudantes criarem, sob sua supervisão, claro, games para os colegas sobre os conteúdos que estão estudando? Gostou da ideia? Expresse sua opinião nos comentários, pois este pode ser o tema de futuros posts do Que jogo é esse?.
Até semana que vem, em que fecharemos essa série de mitos envolvendo jogos digitais, crianças e adolescentes.
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